Assaltante compassivo
31 de julho de 2010
Esta narrativa que coloco aí abaixo é uma prova de que esta onda de assaltos não é só gaúcha e porto-alegrense: um estudante universitário de Florianópolis já foi assaltado três vezes e está contando como foi a última.
É um texto saboroso, que vale a pena ler, melhor que se fosse uma coluna minha. O rapaz escreve bem e só tem 22 anos:
*
"Caro Sant'Ana. Fui caminhando e olhando pra frente, não iria dar bola pra ele. Mas ele deu bola pra mim. Eu sou irresistível, pelo menos para assaltantes. Uns dizem que eu tenho cara de rico, outros que eu tenho cara de trouxa. O fato é que em 22 anos eu nunca tinha sido assaltado, e essa era a terceira tentativa em três meses. Acho que são esses tênis All Star que enfraqueceram minha aparência viril.
Eram quatro horas da tarde!
O negão parecia o Will Smith no Hancock. Barbudo, de touca e de casaco canguru cinza. (Se fosse feito um B.O., seria: um masculino de cútis negra, com barba, vestindo gorro e casaco modelo surf 'canguru' cinza. 1,70m de altura.). Ele atravessou a rua e veio direto. Não tinha motivo nenhum para ele atravessar a rua no meio dos carros daquele jeito, além de me assaltar, porque do outro lado não tem nada, tinha eu. Era óbvio que ele ia tentar me assaltar.
Continuei caminhando, não corri, era óbvio o porquê. Eu não tinha nada.
O Hancock falou alguma coisa que eu não lembro, levantou o casaco e mostrou o negócio. O negócio que eu digo era uma arma. Eu atraio assaltantes, não estupradores. Piadinhas à parte, ele disse então pra eu continuar andando, sem sacar a arma. 'Passa a carteirinha e o celularzinho, só isso'. Que gentil! Eu olhei meio atônito pra ele, mas não tava nervoso, afinal eram quatro da tarde e ele só me daria um tiro ali se fosse louco (e era meu terceiro assalto, experiência traz tranquilidade). Ele parecia um dos trapalhões com aquele gorrinho do Didi e aquela cara de Mussum, mas com barba.
"Pô, mano, eu não tenho nada".
"Deixa eu ver".
"Se eu não tenho nada, como que vou te mostrar?"
"Vou puxar a carteira aqui, ok?"
"Deixa eu ver esse bagulho".
"Olha, não tenho nem documentos, quanto mais dinheiro. Tá aqui o B.O., fui assaltado mês passado, não tenho mais celular".
Eu tirei o boletim de ocorrência e abri pra mostrar pra ele, enquanto ele analisava minha carteira.
Não parei de falar um segundo, indignado. Quando eu disse que era professor, ele se compadeceu.
"Ah, cara. Desculpa mesmo, mano. Desculpa mesmo. Só faço isso porque não tenho dinheiro e minha família tá passando fome".
INACREDITÁVEL! Ele ficou com pena de mim.
Continuei falando, meio puto, e ele continuou pedindo desculpa. Eu não tava entendendo mais nada, e bateu uma certa pena dele, tanto que ofereci pra ir no mercado e comprar alguma coisa no crédito (desde que não fosse uma TV de plasma ou um Playstation).
Ele recusou! Ainda me disse: "Capaz, mano. Não precisa. Compra alguma coisa pra ti", e continuou pedindo desculpa. Bateu um arrependimento gigante nele, parecia que era o primeiro assalto (dele, não meu, óbvio). Saí caminhando desconfiado e me sentindo meio mal. Ele voltou, me deu um abraço breve e pediu desculpas de novo.
Caminhei uns cinco metros, olhei pra trás e ele já tava em cima de outro cara pra assaltar. Então ele não tava arrependido.
Um assaltante ficou com pena de mim. É de se pensar.
Seria ele o Robin Hood moderno? Que rouba apenas dos que têm pouco, não dos que não têm nada? (ass.) Felipe Costa, estudante de jornalismo da UFSC."
* Texto publicado hoje na página 55 de Zero Hora
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